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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

sábado, 10 de agosto de 2013

PAIS & FILHOS




LUIZ MARTINS DA SILVA


I
Há quem antes bendiga,
Longe do tempo e razão,
Quem será pai, filho, irmão.

II
Um dia o homem,
Ator por um triz,
Aparece embrião.

III
O mundo os viaja.
Quando um caminha,
O outro é estrada.

IV
Um, vai à lavra;
O outro reserva
Futuros sonhados.

V
Já quase ombros,
Confronto de alfas,
Conflito de heróis.

VI
Amor de pai,
Amor de filho,
Amor de irmão.

VII
Um dia, na tribo,
Louvor ancestral,
É dia dos pais.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

PÉS DESCALÇOS


            
          Beatriz, aos vinte anos comunicou-nos que ia deixar o mundo e ser Carmelita descalça. Lembrei-me subitamente dela aos quatro anos, depois aos dez, usando óculos, depois desabrochando de menina à moça.  Todas as fotografias desfilam diante de mim. Lembro-me da menina linda, olhando o mundo com o queixo e os olhos de quem olha as nuvens - O cabelo numa desobediência balança os pequenos cachos, milhares deles, soprados ao vento. Não sei dos sentimentos dos outros, mas pensei imediatamente na saudade da mãe, do pai, do irmão.  Pensei em todos os que em silêncio, tentavam entender. Vi as mãos estendida ao abraço e o toque nos ferros enfileirados da cela. Bia não foge de uma desilusão, não tem medo de enfrentar o mundo. Um mundo que derrete pelas bordas, que geme dor. É por este menino, que chora no escuro,  que as carmelitas oram. Oram antes do sol nascer, oram no meio da tarde, oram ao por do sol. Bia, como todas as jovens Carmelitas, quer ser criadora de fios: fios de amor e luz.

L.A

terça-feira, 23 de julho de 2013

NAS ASAS DA BORBOLETA





No mistério do sem-fim equilibra-se um planeta. 
E, no planeta um jardim
e, no jardim um canteiro;
no canteiro uma violeta,
e, sobre ela o dia inteiro.
Entre o planeta e o sem-fim,
 a asa de uma borboleta.
Cecília Meireles

quinta-feira, 4 de julho de 2013

ENTRE ASPAS







"Eu me lembro que um dia acordei de manhã e havia uma sensação de possibilidade. Sabe esse sentimento? E eu me lembro de ter pensado: Este é o início da felicidade. É aqui que ela começa. E é claro haverá muito mais. Nunca me ocorreu que não era o começo. Era a felicidade. Era o momento. Aquele exato momento."
                                                                                                                    
                                                                                                                          Virgìnia Woolf
                                                                                       

sexta-feira, 21 de junho de 2013

ORDEM E DESORDEM

 



LUIZ MARTINS DA SILVA

Era a tua pedra,
E a nossa vidraça.

Era a tua ira,
E a nossa praça.

Era o teu molotov,
E o nosso palácio.

Era o teu piche,
E as nossas estátuas.

Era a tua barbárie,
E os nossos lemas.

És por acaso um filho
Da mesma Pátria em luta?


Foto- André Dusiake- canal R7

terça-feira, 18 de junho de 2013

ÁGUA E BANHOS




LUIZ MARTINS DA SILVA


Não existe banho de mar,
Quem se banha não é o corpo.
O mar é a própria essência cósmica
De um oceano de energias quânticas.

Não existe banho de rio,
Quem se banha não é o ego.
Os rios são estrelas líquidas
De uma constelação de carícias.

Não existe banho de chuva,
Quem se banha não é a mente.
Chuvas são aspersões do sagrado,
Miríades de pétalas nirvânicas.

Não existe sede de água,
Quem bebe não é a alma.
A água é a própria comunhão divina
De Criador e criaturas.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

ASSOVIO NO ESCURO




LUIZ MARTINS DA SILVA

De verdade, de verdade, não existe.
Ele é só o lado avesso da presença.
Mas, como hei de convencer a criança
De que ele não passa de uma sombra do arcaico?

Hoje, por desígnios de milênios,
Há um silêncio que expande a própria noite,
Feito elástico que só decorou plano de ida,
Momentos de vidas, eu sei, eles jamais voltam.

Imagino reter o mundo no ponteiro dos segundos,
Mas o rio é insistente no seu curso.
Águas se renovam, não os nossos rostos.

Nada há de garantia no cândido acalanto
De que o tempo é uma ilusão dos sentidos
Que só age nestes confins de nossa nebulosa.

sexta-feira, 31 de maio de 2013

DEVOÇÕES




LUIZ MARTINS DA SILVA

Aos domingos, lá na feira,
Como parte de um culto,
Tantas provas em oferta,
Tenças de frutos em dádiva,

II

Chegando a estação da seca,
No ofício, o jardineiro,
Tange entulhos qual no hino
Que de fato louva ao vento.

III

São, assim, à sua maneira,
No linho as almas do povo:
Cinco da manhã, de vinda
E noutras tantas de volta.

IV

Pessoas de poucos números,
Mas de tanto molde em conta,
Como podem ser felizes,
Comendo marmita a um canto?

V
Eu os consagro na memória
Do confrade que já fui,
Na lavra e no eito, jornada,
De sol a sol, castos grãos.

VI

Carreiros, formigas humanas,
Na oração do trabalho,
Apostolado de doces,
Evangelistas de folhas.

VII
No sétimo dia, guardara;
No ócio das horas ocas,
O quinhão da santidade,
Dízimo da sexagésima.


sábado, 11 de maio de 2013

terça-feira, 7 de maio de 2013

AS DUAS CASAS



LUIZ MARTINS DA SILVA

A casa,
Já não é a mesma,
Da planta original,
Tantos acréscimos e adaptações.

Por fim, parei, desisti, ao descobrir:
Casas são projeções de um espaço mental.
Com seus labirintos de uma vida para dentro
E de tudo que nos habita em aposentos folhados.

Não tarde descubro, meu coração é só o âmago
De um universo de memórias e pulsações,
De uma história afetiva que emenda retalhos de tempos
Num cerzir constante de apreender amores.

Agora, estou mais leve,
Por saber das casas,
A de fora, concreta, finita.
A de dentro, autoconstrução interminável.

Agora, posso dormir,
E até acordar, tanto faz.
Já não me circunscreve aquele espaço
Aonde, indevidamente, escrevem: “Jaz”.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

O CORPO DE DEUS



LUIZ MARTINS DA SILVA


D'Ele sempre me disseram
Ser vasta existência,
Insondável anti-matéria.


Raros o viram,
Alguns o ouviram,
Em seu nome todos falam.


Creio-O de fato infinito,
Mas de ausência presente,
Tantas as manifestações.


Teimo ser-Lhe testemunho,
No abrir das flores,
Sorriso de criança.

Deus é infantil,
Estuda física fractal,
Deita-se em leitos de delírio.


Senão por que desenha iguanas?
E hachuras de folhas?
E tramas de maré na areia?

Dele me vêm alguns toques,
Nada físico, sopro do sensível,
Ele aprecia música.


Cismo-O não uno corpo,
Mas, fragmentado de tudo,
Detalhes de passarinho.

Borboletas, então, coleciona.
Flores, hobby predileto.
Latifúndios de tulipa.


Certa vez o surpreendi,
Orvalho de orquídea,
Joaninha lambendo rosa.

Acho que ele curte praias,
Meditações solitárias,
Procurá-lo é para dentro.

Vê-lo é o tudo afora,
O para sempre do vento,
O mar sem fim da metáfora.

Toda vez que se ama, 
Ele nos agasalha,
Com seu manto morno de plumas.
.

domingo, 14 de abril de 2013

ENTRE ASPAS



Porque somos imperfeitos, ou supomos sê-lo, a luz nos 

ofusca. 

E porque a luz nos ofusca

fechamos os olhos.

E tudo continua escuro.



KEILA ABREU


terça-feira, 19 de março de 2013

A PIPA E O TEMPO



LUIZ MARTINS DA SILVA


A pipa, empinada é mais que  o pássaro,
Pois não avoa a ave acima do Sol:
Contra o olho, a pino,
O primor, prumo, rabiola e cerol.

O menino e a pipa aos céus,
São mais que arcanjos,
Pois mesmo não lhes sendo as asas,
Igualam-se em sonhos , alados querubins.

O menino avia, envia a pipa,
Como quem dá espinha ao peixe,
Para que tenha estrutura, navegue, flutue,
Sobrevoe o vago, alto mar, altivo.

Em breve o menino; a tarde; o orvalho...
O inquieto sopro da vida, a liberdade...
Enquanto a infância, não a leve o vento,
Não lhe cesse a brisa, tão logo ao trabalho.

domingo, 10 de março de 2013

TODAS AS VIDAS




Cora Coralina

Vive dentro de mim
uma cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada ao pé do borralho,
olhando pro fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço...
Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo...

Vive dentro de mim
a lavadeira do Rio Vermelho,
Seu cheiro gostoso
d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa,
pedra de anil.
Sua coroa verde de são-caetano.

Vive dentro de mim
a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga
toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.

Vive dentro de mim
a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda,
desabusada, sem preconceitos,
de casca-grossa,
de chinelinha,
e filharada.

Vive dentro de mim
a mulher roceira.
– Enxerto da terra,
meio casmurra.
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos.
Seus vinte netos.

Vive dentro de mim
a mulher da vida.
Minha irmãzinha...
tão desprezada,
tão murmurada...
Fingindo alegre seu triste fado.

Todas as vidas dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera das obscuras.

(Histórias das ruas e becos de Goiás)